sábado, 26 de abril de 2008

Liturgias do Catimbó


Abertura de trabalhos

A abertura da mesa é uma liturgia simples, mas significativa e bonita. Lidamos com uma pratica ritual pouco elaborada de forma que algumas poucas coisas podem ser destacadas como de beleza própria.

A abertura de mesa deve ser um ritual importante e solene. É claro que cada jurema é uma jurema e cada um pode ter sua forma de trabalhar com o mundo espiritual, mas a solenidade da abertura da mesas é sempre tocante.

Deve-se louvar o nosso senhor Jesus Cristo, pedindo licença para abrir a mesa e exaltando a força da Jurema. Podem ser recitadas preces como a de Cáritas e entoados cantos de abertura como o seguinte:

Bate asa e canta o galo dizendo cristo nasceu cantão os anjos nas alturas Rei nuino Gloria no céus se deu.

Gloria nos céu se deu nas portas do Juremá abre e de licença Santa Tereza para os mestres trabalhar.

Oh minha Santa Tereza pelo amor de meu Jesus abre a mesa e de licença Santa Tereza pelo irmão João da Cruz

Por deus eu te chamo por Deus eu mandei chamar [ mestre tal ] da Jurema para vir trabalhar. Depois disso inicia-se as cantigas em roda, sempre alegres e animadas e os mestres virão um a um se acostar para trabalhar.

Iniciação

A iniciação no Catimbó se faz com rituais simples porém com muita significação. O primeiro ritual que passa um discípulo é a jura no qual ele deve se confirmar como um discípulo da Jurema. Com o passar do tempo e sua evolução ele irá receber o seu cachimbo que será consagrado por um Mestre. Será através deste cachimbo que ele fará os seus trabalhos. Finalmente após alguns anos ele deverá realizar o tombo onde se confirmará como um Mestre em vida do Catimbó.

Tombo

O tombo de jurema constitui-se no processo pelo qual muitos dos Mestres que hoje estão no mundo espiritual passaram para ganhar ciência. Tombam no pé da jurema e ao acordar estão prontos para trabalhar. Foi o caso do Mestre Carlos, famoso por seu dom de cura nas mesas de jurema de todo o Nordeste.

Contudo nos terreiros o rito foi tornado bem mais complexo que sua referência mística. O tombamento consiste então no oferecimento de alimentos e sacrifícios às correntes espirituais do iniciante. Nele comem o caboclo, o Mestre, a mestra, o exu e a pombagira do iniciante. Acontece ainda a juremação com a implantação da semente através do corte na pele e a viagem espiritual. A viagem deve acontecer no período que se intercala entre a oferta dos sacrifícios ao caboclo e a preparação das comidas oferecidas em banquete ritual. Ainda durante o sacrifício o iniciante é levado durante o transe para correr as cidades espirituais. O interessante e singular neste transe é que os adeptos acreditam que enquanto a pessoa é levada para realizar a viagem espiritual, o caboclo permanece no corpo do iniciante.

Concluído o sacrifício passa-se à preparação das carnes dos animais e à partição das frutas e alimentos oferecidos aos encantados. O caboclo é alimentado com uma pequena porção de tudo que foi oferecido. Findo o banquete, o caboclo é então mandado de volta a sua cidade e o filho deverá contar ao seu iniciador o que viu. Se a viagem for considerada válida seguem-se os sacrifícios às demais entidades: o Mestre, a mestra, o exu e a pombagira.

No dia posterior, em animada festa o caboclo vestido a caráter deverá como na iniciação do candomblé gritar o seu nome e também cantar a sua toada (cantiga). O iniciante também poderá vestir as demais entidades quem deu de comer. A riqueza deste ritual completa está intrinsecamente ligada às condições financeiras do iniciante. Sem dúvida este ritual segue o formato do Candomblé.

Juremação

Muitos juremeiros dizem que “um bom Mestre ja nasce feito”; contudo, alguns ritos são utilizados para fortificar as correntes e dar mais conhecimento mágico-espiritual aos discípulos. O ritual mais simples, porém de muita ciência, é o conhecido como juremação, implantação da semente ou ciência da jurema. Este ritual consiste em plantar no corpo do discípulo, por baixo de sua pele, uma semente da arvore sagrada.

Existem 3 procedimentos para a juremação dos discípulos. No primeiro, o próprio Mestre espiritual é o responsável pela implantação da semente. Esse Mestre promete ao discípulo e após algum tempo, misteriosamente, surge a semente em uma parte qualquer do corpo. O segundo procedimento é aquele em que o líder religioso, o juremeiro, realiza um ritual especial, em que dá a seus afilhados a semente e a bebida de jurema para beber. Após este rito, o iniciante deve abster-se de relações sexuais por sete dias consecutivos, período em que todas as noites ele devrá ser levado em sonhos, por seus guias espirituais, para conhecer as cidades e aldeias onde aqueles residem. Ao final deste período, a semente ingerida deverá reaparecer embaixo de sua pele. Caberá ainda ao iniciante contar ao seu iniciador o que viu em sonho para que este reconheça ou não a validade de viagens espirituais e por conseguinte da juremação. Em um terceiro procedimento o juremeiro implanta a semente da jurema através de um corte realizado na pelo do braço. piru

Mestres do Catimbó


Quem são os mestres do Catimbó

O termo Mestre é de origem portuguesa, onde tinha o sentido tradicional de médico, ou segundo Câmara Cascudo, de feiticeiro. Este é o primeiro elemento de ligação do Catimbó com tradições européias, provavelmente cabalistas e mostra também nestes 2 significados a expressão semântica do trabalho do Mestre, a cura e a magia.

De forma geral os Mestres são descritos como espíritos curadores de descendência escrava ou mestiça, que em suma é a característica dos habitantes das regiões onde o Catimbó floresce, mas que não deve ser tratado como um dogma. Dizem os juremeiros que os Mestres foram pessoas que quando em vida trabalharam nas lavouras e possuíam conhecimentos de ervas e plantas curativas Po outro lado algo trágico teria acontecido e eles teriam se passado, isto é, morrido, encantando-se, podendo assim voltar a acudir os que ficaram “ neste vale de lágrimas”.

Não existe Mestre do bem ou do mal. O Mestre é uma entidade que pode fazer o bem ou o mal de acordo com a sua conveniência, a ordem da casa e a ocasião.

A função dos Mestres e do Catimbó

Nesta generalização podemos entender muito bem o como e porque do culto do Catimbó. Em uma região dominada pela pobreza e falta de assistência a população carece de assistência médica sendo a doença um temor presente e terrível. Neste sentido os Mestres se apresentam como enviados para socorrer e aliviar o sofrimento dos desasistidos oferecendo a tradição da medicina fitoterápica, herdade dos índios para assistir a população. Por outro lado em regiões de pessoas simples mas que são submetidas a poderosos, violentos e jagunços onde falta a justiça do homem e a única proteção que todos podem contar é a misericórdia divina, os Mestres são como anjos vingadores que, apesar de ainda fortemente influenciados por suas manias e imperfeições humanas, se colocam assim mesmo como protetores e defensores de gente desasistida.

Desta maneira podemos entender que os caminhos de Deus são inúmeros e que a espiritualidade se manifesta da forma como é necessária para garantir uma vida justa e decente aos habitantes desta terra fria. É neste contexto que o Catimbó se insere, absorvendo a tradição religiosa de gente simples e adicionando a esta base espiritual fortemente calçada em princípios de ética, bondade e misericórdia do cristianismo a necessidade do dias a dia introduzindo os ritos mágicos de trabalho e o trabalho dos espíritos acostados.

Mestres são entidades alegres, brincalhonas que guardam muito do comportamento de vida. Eles trabalham nas seções com simplicidade, conversando com as pessoas na língua que todos falam deixando todos à vontade. Eles não tem que se parecer pomposos ou importantes e vão sempre deixar todos muito à vontade. Suas cantigas são alegres e suas danças iguais as que todos dançam.

Seria muito mais difícil se o Catimbó trouxesse uma doutrina religiosa própria. Na realidade seria até mesmo impróprio ou desnecessário. Trata-se de gente muito simples que aprendeu e passou a vida toda aprendendo so conceitos e ensinamentos católicos estando possivelmente muito acostumados e doutrinados nesta verdadeira fé.

Os próprios Mestres que foram seres humanos provavelmente passaram a vida mergulhados nesta fé de maneira que não ha necessidade de substituir esta catequese por novos conceitos para suprir a mesma finalidade, de forma que diferente das religiões afro que impõe uma nova teogonia que tanta confusão causa nas cabeças mais fracas ou humildes que por vezes passam a vida em terreiros se entender de verdade o que fazem ficando a vida toda dependente de outros (o que provavelmente pode ser a finalidade de alguns ).

Pior ainda na Umbanda que pena pela total desordem em função de ser uma prática que facilmente agrega qualquer tendência mística e espírita fazendo uma mistura inexplicável de pratica religiosa e mágica. A Umbanda se comporta como um consumidor curioso em um supermercado que vai passando pelas gondolas e colocando em seu carrinho as novidades e os produtos de embalagem mais bonita.

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